Transplante de coração: pacientes de SP celebram 1º ano de ‘vida nova’
Receptores contam como a cirurgia mudou a forma de enxergarem a vida
Foto: Govesp
A operadora de caixa Andreza Regina Paricini, de 28 anos, guardará para sempre na memória o mês de setembro de 2023. O transplante cardíaco realizado há pouco mais de um ano mudou a vida da jovem, que sofria com um quadro de cardiopatia genética, condição caracterizada por anormalidades nas estruturas do coração.
Em março de 2022, após um quadro de arritmia que a deixou internada, Andreza descobriu que necessitaria de um novo órgão. “Fiquei muito apreensiva quando descobri. Ansiosa para saber quando iria ser chamada para o transplante. Mas estava disposta a esperar. Só queria ter uma vida melhor, então pensei em seguir aguardando e rezando para que tudo desse certo”, conta Andreza.
Após nove meses da fila de espera, ela relembra o momento em que recebeu a notícia de que o procedimento havia sido aprovado para ser realizado no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, unidade hospitalar de administração direta da Secretaria de Estado da Saúde (SES-SP): era um domingo, véspera de aniversário de seu pai. Apesar da ansiedade para saber se de fato iria receber um novo coração, o clima entre a família foi de extrema felicidade. “A notícia foi o maior presente que ele poderia receber”, diz.
Entre janeiro de 2023 a agosto de 2024, foram realizados 260 transplantes de coração no Estado de São Paulo, levando a oportunidade de uma nova vida a pessoas como Andreza. De janeiro a agosto deste ano, o estado já realizou 79 procedimentos. Somente no Instituto Dante Pazzanese, são 16 transplantes cardíacos feitos por ano, em média.
A operadora de caixa relata que o principal desafio durante o processo de espera pelo transplante foi a dificuldade emocional em lidar com o quadro. “Às vezes eu acordava bem e em questão de minutos ou horas, estava mal, com enjoos e pensava ‘o que eu fiz pra isso acontecer?’”.
A jovem conta que teve o apoio de toda a família e da equipe médica do hospital, com quem pôde criar uma relação de amizade que se estende até hoje. “Quando eu venho ao hospital eu visito todo mundo, porque sempre tive um tratamento maravilhoso. Acho que eu não receberia em nenhum outro local todo o carinho que recebi aqui”.
Como principais mudanças após o procedimento, Andreza destaca hábitos que antes não eram tão simples de serem realizados, como arrumar a própria casa, fazer exercícios físicos e realizar alguns dos seus maiores sonhos, antes impossibilitados. “Quero ter o meu bebezinho. Sempre quis muito ser mãe, mas tinha que escolher entre a criança ou eu. Casei recentemente e agora desejo ter um filho e fazer também a minha faculdade de pedagogia”, conta a jovem sorridente.
Quando perguntada sobre qual a primeira coisa que desejou fazer após o transplante, Andreza olha para a médica que acompanhou seu caso, sorri e conta. “O que eu queria mesmo era pular de paraquedas ou bungee jump. Antes eu não podia, mas agora quem sabe, né?”.
“Um coração novo e uma nova vida”
Transplantando em junho de 2023, o aposentado de 51 anos Milton de Freitas Silva relata um desejo similar ao de Andreza, mas com uma pequena diferença. Pai de quatro crianças, a rotina do tratamento e as longas internações o impossibilitavam de cuidar plenamente das crianças.
Com insuficiência cardíaca, Milton teve o quadro classificado como doença idiopática. Desde 2012, o aposentado vivia entre idas e vindas ao hospital, até descobrir que necessitava de um transplante.
“Eu fiquei oito meses na fila e, durante esse tempo, vinha fazendo tratamento. Foi muito difícil, não é fácil você ter um problema de coração e saber que a qualquer momento você pode morrer. Quando entramos na fila, já sabemos que nosso caso é bem avançado, então de certa forma, nos deixa assustado”, conta.
Milton relembra o dia em que recebeu a notícia informando sobre um coração disponível. “Estava sozinho e imediatamente liguei para minha esposa para contar. Não conseguia acreditar, fiquei paralisado, receoso sem saber se daria certo. Só acreditei quando acordei da cirurgia e a primeira coisa que perguntei foi: “Fizeram o transplante?”.
Como principais mudanças após a cirurgia, Milton se emociona ao destacar o cuidado com a família. “Hoje eu posso cuidar dos meus filhos, da minha esposa, faço de tudo, de forma moderada. Vivo maravilhosamente bem. Hoje me sinto um rapaz de 30 anos. Mas o melhor de tudo, sem dúvidas, foi pegar minhas crianças no colo, que antes eu não podia e só os via a cada 15 dias quando estava internado”, conta com os olhos marejados.
Milton agradece a família dos doadores e ressalta a importância da doação de órgãos. “Acredito que deveria ter mais incentivo para a doação, sei que não é fácil para os familiares, mas é um gesto que salva tantas pessoas. À família do meu doador, eu só tenho a agradecer, pois hoje me considero um milionário. Ganhei um coração novo e uma nova vida”.
Como funciona o transplante cardíaco?
O Estado conta atualmente com 198 pessoas que aguardam receber um novo coração. O procedimento é realizado no Brasil desde 1968 e o tempo máximo da captação do órgão e do implante no receptor é de 4 horas. É o processo chamado de isquemia.
O transplante é considerado uma alternativa para doenças cardíacas, conforme explica a médica do setor de transplantes e insuficiência cardíaca Dante Pazzanese, Carolina Casadei dos Santos. “A insuficiência cardíaca é a via final de várias doenças cardíacas ou problemas de saúde não tratados como diabete, hipertensão, que podem levar a insuficiência cardíaca”.
A médica explica que uma vez que é feito o diagnóstico de insuficiência cardíaca, são iniciadas a terapia com remédios e a reabilitação cardiopulmonar. “Se o paciente continuar sintomático, com sinais de cansaço, falta de ar para a realização de qualquer tipo de atividade, começamos a cogitar o transplante cardíaco”.
Para a realização do procedimento, o paciente precisa estar com a alimentação adequada, alinhada à prática de exercícios realizados na unidade hospitalar para evitar a perda excessiva de massa muscular.
Após a cirurgia, alguns cuidados devem ser tomados como evitar locais com aglomeração. “O paciente que passa pelo transplante necessita de remédios para o resto da vida a fim de evitar rejeição do órgão, e esses medicamentos abaixam a imunidade, então a maior preocupação é em relação a infecções. Por isso, evitar locais com que possam ter muitos vírus e bactérias circulando é a principal medida de cuidado”, afirma a especialista.