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Por Thomas

Bicho urbano: quem são os animais que resistem às nossas cidades?

Um ensaio ecológico e científico sobre a fauna silvestre que sobrevive — e se adapta — ao espaço urbano

Por Thomas

Coluna Papo Verde com Dani Fumachi

Nas metrópoles brasileiras, entre o asfalto quente e as estruturas de concreto, uma fauna resistente, invisível e fundamental insiste em existir. São corujas, gambás, morcegos, capivaras e tantos outros animais que encontraram, nas sobras das cidades, uma chance de sobrevivência. A presença desses seres não é apenas uma curiosidade urbana: ela carrega implicações ecológicas profundas, exigindo novos olhares sobre planejamento urbano, saúde pública e conservação ambiental.

A adaptação silenciosa

A urbanização é uma das principais causas de perda de biodiversidade no planeta. Segundo o relatório da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES, 2019), mais de um milhão de espécies animais e vegetais correm risco de extinção, e a fragmentação de habitats provocada pelo crescimento desordenado das cidades é uma das razões centrais.

No entanto, algumas espécies demonstram notável capacidade adaptativa. Animais como Athene cunicularia (coruja-buraqueira), Didelphis albiventris (gambá-de-orelha-branca), morcegos frugívoros e até capivaras (Hydrochoerus hydrochaeris) vêm se integrando ao cenário urbano com comportamentos alterados, estratégias alimentares ajustadas e, muitas vezes, maior tolerância ao contato humano.

Corujas-buraqueiras: vigilantes do concreto

Presença recorrente em áreas abertas de cidades como São Paulo, Belo Horizonte e Brasília, as corujas-buraqueiras se estabeleceram em praças, terrenos baldios e campos de futebol. Um estudo da Universidade Federal da Bahia (2022) mostrou que essas aves apresentam menor distância de fuga em ambientes urbanos, indicando alterações comportamentais induzidas pela constante presença humana. Ao caçarem pequenos roedores, essas aves também exercem um importante papel no controle biológico.

Gambás: aliados da saúde urbana

Rotineiramente confundidos com animais perigosos, os gambás são, na verdade, essenciais para a saúde dos ecossistemas urbanos. São onívoros e alimentam-se de frutas, insetos e até escorpiões. Sua presença está associada ao controle de artrópodes urbanos, o que pode reduzir a incidência de acidentes com animais peçonhentos. Dados do Instituto Butantan apontam que áreas com populações estáveis de gambás tendem a apresentar menor ocorrência de escorpiões (Tityus serrulatus), devido à predação de ovos e ninfas.

Morcegos: vigilantes noturnos invisíveis

Embora muitas vezes estigmatizados, os morcegos representam um elo vital nos ecossistemas urbanos. São responsáveis pela dispersão de sementes, polinização e controle populacional de insetos. Um levantamento da Universidade de Brasília (2021) revelou que morcegos insetívoros das áreas urbanas do Cerrado consomem, em média, até 70% do seu peso corporal em insetos por noite, contribuindo diretamente para a redução de pragas agrícolas e urbanas, e indiretamente para a diminuição do uso de pesticidas.

Capivaras: entre o rio e o asfalto

A maior espécie de roedor do mundo, a capivara, encontrou refúgio em parques e margens de córregos urbanizados. Em São Paulo, por exemplo, sua presença é notável nas regiões do Parque Ecológico do Tietê e nas margens do Rio Pinheiros. Um estudo publicado na Acta Veterinaria Brasilica (2023) demonstrou que, em ambientes urbanos, capivaras ajustam seu padrão de atividade para períodos noturnos a fim de evitar o tráfego humano, revelando plasticidade comportamental significativa.

O desafio da convivência

A presença de fauna silvestre em áreas urbanas não é apenas um efeito colateral da urbanização. Ela é também um indicador da nossa responsabilidade ambiental. Esses animais não estão invadindo: estão resistindo. Estão sobrevivendo onde restou espaço. E sua permanência pode trazer benefícios ecológicos, educacionais e sanitários — desde que haja políticas públicas voltadas à conservação da biodiversidade urbana.

A criação de corredores ecológicos, o manejo adequado de áreas verdes e o incentivo à educação ambiental são caminhos possíveis para promover uma convivência harmônica entre humanos e não-humanos nas cidades.

A fauna urbana não é uma anomalia: é um reflexo da adaptação e da resiliência biológica. Reconhecer esses animais como parte legítima do ecossistema urbano é um passo essencial para repensar a cidade — não mais como oposição à natureza, mas como uma de suas extensões.

Preservar a vida silvestre em meio ao concreto não é romantismo. É ciência. É ética. E é urgente.

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