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Por Thomas

A desconexão com a natureza e a crise da humanidade

Coluna Papo Verde Por Dani Fumachi e Denise Moraes

Por Thomas

Na última coluna, abordamos o tema da reconexão com a natureza como um caminho para resgatar nossa saúde emocional e reconstruir nosso senso de pertencimento ao planeta. Falamos sobre como o distanciamento dos espaços naturais tem gerado impactos profundos na forma como vivemos, pensamos e sentimos, refletindo-se diretamente em uma sociedade mais ansiosa, desconectada e indiferente às urgências ambientais.

Agora, damos um passo adiante nessa reflexão: se a crise ecológica é, antes de tudo, uma crise de consciência, o que podemos fazer para transformar essa realidade? Como reverter esse cenário de alienação ambiental e reconstruir a relação entre o ser humano e a Terra?

A resposta pode estar onde tudo começa: na educação.

Reconhecido como o “pai da medicina”, Hipócrates (460-377 a.C.) foi pioneiro na observação e no acompanhamento dos sintomas dos pacientes e também por sua reflexão sobre os efeitos nocivos da desconexão do ser humano com a vida natural. Centenas de anos antes da contagem do ano I no calendário, o médico grego já havia percebido que o distanciamento da vida junto ao meio ambiente impactava a saúde física da população. Também há indícios de que Hipócrates indicava banhos e retiros junto à natureza como parte do tratamento para as doenças da época e havia concluído que a alta concentração de pessoas em determinadas áreas criava problemas sanitários e até epidemias.

Mais de 2.000 anos após essa constatação, a desconexão da natureza, empurrada pela vida moderna, tem levado a população mundial a uma crise de saúde física e mental nunca antes experimentada pela humanidade, acompanhada de um impacto ambiental sem precedentes na Terra.

De fato, o planeta como o conhecemos nunca esteve tão adoecido. A população tem trabalhado mais e por mais tempo ao longo da vida, concentrando-se nos centros urbanos e vivendo cada dia mais trancada, seja em casa ou no trabalho, buscando acompanhar o desenvolvimento tecnológico, produzir e sobreviver em um mundo cada vez mais capitalizado e menos verde. O homem moderno agora vive apressado, estressado, atrasado e sem tempo (nem disposição) para sair ao ar livre, bombardeado por informações, cobranças e telas.

Enquanto isso, os ecossistemas que sustentam nossa existência colapsam. Em nome do “progresso”, avançamos sobre florestas que garantem o equilíbrio climático, envenenamos solos com pesticidas, contaminamos aquíferos, extinguimos espécies a um ritmo 1.000 vezes maior do que o natural. O modelo de vida urbano nos afasta da natureza ao mesmo tempo que depende de sua destruição para se sustentar. Um paradoxo suicida.

Em contrapartida, as crianças nunca tiveram tantos diagnósticos de transtornos e jamais foram tão medicadas como se vê nos dias atuais. O jornalista e autor americano Richard Louv, em 2005, no best-seller A Última Criança na Natureza: Resgatando Nossas Crianças do Transtorno do Déficit de Natureza (primeira edição no Brasil em 2016), apontou os riscos da desconexão com a natureza em relação à saúde infantil e cunhou o termo Transtorno do Déficit de Natureza (TDN), dando início a diversos estudos científicos na área, que comprovaram que o afastamento da criança do meio ambiente tem conexão direta com o aumento de transtornos e doenças.

O que vemos hoje é uma geração que cresce em espaços reduzidos, privada da vivência ao ar livre, do contato com a terra, do aprendizado natural com outros seres vivos. O aumento dos índices de TDAH, da obesidade e do sedentarismo infantis, do estresse, da depressão, do transtorno de tela, da miopia, da carência de vitamina D, além da diminuição da criatividade e da autoconfiança das crianças, está diretamente ligado à falta de convivência com ambientes naturais e verdes. Além disso, desconectadas da natureza e privadas das brincadeiras ao ar livre em coletividade, as crianças têm apresentado menos empatia e não se sentem parte do meio ambiente, o que dificulta sua sensibilização para a preservação ambiental e das espécies.

Ainda mais alarmante, a OMS tem sugerido que a atual geração de crianças pode vir a ser a primeira a ter uma expectativa de vida menor que a de seus pais. O motivo? O mundo não tem conseguido proporcionar uma vida saudável nem garantir um clima favorável para o futuro. Estamos diante de uma combinação perigosa: alimentos processados, sedentarismo, poluição do ar, um colapso dos ecossistemas naturais e uma sociedade cada vez mais dependente de telas e menos conectada com os ciclos naturais da vida.

E enquanto crianças crescem em apartamentos estéreis, respiramos um ar saturado de poluentes, consumimos alimentos encharcados de agrotóxicos e bebemos uma água que carrega resíduos de medicamentos e metais pesados. Os oceanos, que absorvem a maior parte do CO₂ emitido, estão se tornando ácidos, comprometendo cadeias alimentares inteiras. O desmatamento avança sem freios, roubando da atmosfera sua capacidade de equilíbrio térmico e reduzindo a biodiversidade de forma irreversível.

E não há saída milagrosa. Não haverá tecnologia capaz de substituir um solo vivo, uma floresta íntegra ou um ciclo hidrológico equilibrado. A desconexão entre humanos e o ambiente natural está nos levando a um ponto crítico: estamos virando uma espécie que destrói o que precisa para viver.

Se queremos reverter esse quadro, precisamos de políticas públicas que priorizem florestas em pé, educação ambiental desde a infância, cidades que respirem, incentivo ao consumo consciente e proteção de biomas ameaçados. Precisamos que crianças toquem a terra, que sintam o vento, que aprendam o valor de um rio limpo. Precisamos que a vida retorne para dentro do planejamento urbano, que áreas verdes sejam acessíveis e que a natureza volte a ser um direito, e não um luxo.

A solução não está só em tratados internacionais ou promessas eleitorais. Está em entender que cada metro quadrado de floresta derrubada, cada rio contaminado e cada espécie extinta são passos para um futuro sem volta.

Faz-se urgente que os governos tomem providências quanto a isso. Mas não apenas os governos—cada indivíduo precisa compreender que a destruição ambiental e a crise de saúde humana não são problemas isolados, e sim sintomas do mesmo colapso. Estamos adoecendo porque a Terra está adoecendo. E, se não agirmos agora, seremos a geração lembrada não pelo que construímos, mas pelo que deixamos morrer.

A desconexão com a natureza e a crise da humanidade

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